domingo, 18 de novembro de 2018

Pedidos de Nomeações Públicas


Nos tempos imperiais, como em todo tempo no país, a fidelidade partidária pela troca solidária também foi constante. Uma honra entre individuos com alguns interesses em comum. Não prevalecia na totalidade o ideário do Partido Consevador ou Liberal. Muitas vezes sobrepunham em acordo com as circunstâncias pontuais do momento, Prevalecia quase sempre a ascensão eleitoral e a ocupação por cargos. Era importante a manutenção de um eleitorado fiel e aguerrido, mesmo quando as distâncias corporais eram significativas. 
Na segunda metade do século XIX consolidou-se a política dos favores materiais em grande ou pequena escala, principalmente a nomeação para cargos entre aqueles que eram eleitores qualificados e que trabalhavam arregimetando votos para candidatos aos cargos majoritários (deputados provinciais e gerais; senadores) que proporcionasse status social e financeiro ao cidadão político que permanecia comandado políticas nos municípios, sustentando os diretórios e manipulando as juntas eleitorais. A tônica, inclusive, insidia numa rede clientelar com base no parentesco, quando a discussão sobre tal assunto ainda era rarefeita. O que era interessante notar pois estava também baseada em relações parentais bem próximas (por sangue ou compadrio), embora ainda de dificil compreensão histórica quando tratada sobre o crivo das relações internas entre membros de uma mesma família ou apelido que norteavam as linhas de privilégios a conceder. 
Muitos deles possuíam exercícios profissionais próprios, e não apenas lavradores, mas sobretudo comerciantes com grande influência sobre a população urbana e rural.
Entre tantos casos para citar,  o quadro de correligionários regionais do Conselheiro Rodrigues Alvesregionais estendia-se por todo o Vale do Paraíba, notadamente nas pequenas e ainda ricas cidades do café no traçado Guaratinguetá-Rio de Janeiro, como pode-se ver na extensa correspondência pessoal do titular no período do Brasil Império. 
Fosse de forma direta ou indireta, sempre existia a cordialidade do pedido, acompanhado de certa afetividade, preocupação e respeito, semelhantes a uma situação de idolatria e subserviciência. Mesmo daqueles com gabarito social com cabedal suficiente ou políticos da mesma envergadura. 
A série "Rodrigues Alves em Velhos Papéis" traz hoje uma carta, entre outras que virão, mostrando como na prática acontecia os trâmites eleitorais e pós-eleitorais no período. 
A missiva em questão foi escrita quando Rodrigues Alves já conquistara um eleitorado cativo no Vale do Paraíba, e já tendo exercicido mandatos de deputado provincial e geral; e, no momento acabado de entregar a Presidência do Estado de São Paulo para o Doutor Dutra Rodrigues (casado com a filha do Visconde de Guaratinguetá, Maria Augusta). 
A carta viera da cidade de Areias, do farmacêutico carioca Júlio Cesar da Costa Sampaio (1), que ali estabelecera comércio e conquistou confiança das principais famílias e o exercício de vários cargos locais, como presidente da Câmara, delegado de polícia, chefe da instrução pública, suplente de juiz municipal e um dos chefes do Partido Conservador. Um certo forasteiro diplomado com medalha dourada que casou com a filha do Major Laurindo Carvalho Penna (2)
Foi escrita em 8 de maio de 1888 e inicia como tantas outras redações da época, recomendando sáude para toda a famílias, para na sequência abordar o principal objeto da comunicação, o recem criado Segundo Tabelionato da cidade, vago até então. Criado justamente por decreto de Rodrigues Alves em 13/03/1888.
A causa em questão era pedir a intervenção do Doutor Dutra para nomear o seu cunhado Laurindo Penna Junior (3), para ser titular vitalício do referido cartório. Como também para pedir ajuda para a nomeação de outro cunhado, Agostinho Pinto de Sá, para o cargo de Porteiro da Câmara Municipal, cujo presidente, Dr. Gomes de Castro já havia prometido ao mesmo. Um reforço a mais de grande poder de persuasão. 
E termina pedindo desculpas pelo "cacete com estes dois negócios" e referindo a João Alfredo, do Gabinete de ministros do Império (4)
Do porteiro nada foi encontrado, mas Laurindo Júnior foi nomeado serventuário vitalício do Segundo Tabelionato de Areias, em 17 de maio de 1888, nove dias após a missiva enderaçada ao Conselheiro. Foi provido pelo vice-presidente do Estado, o mesmo Doutor Dutra Rodrigues. 
Assim funcionava a extensa clientela em busca de cargos públicos, tão almejados e solicitados. Sinônimo de estabilidade em meio a uma vindoura crise da agricultura. 
O que difere nos dias atuais?


Imagem: Cópia do original depositado no Museu Conselheiro Rodrigues Alves.

Notas

(1) Era filho do médico Joaquim Antônio da Costa Sampaio, professor da Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro, e de Dona Maria Luiza da Cunha.   
(2) Major Laurindo de Carvalho Penna, nascido cerca de 1827 em Areias-SP. Falecido em 10/12/1889 no Rio de Janeiro.
Foi fazendeiro, proprietário e capitalista (empréstimo de dinheiro a juros) e comerciante matriculado no Tribunal do Comércio do Rio de Janeiro, estabelecendo primeiramente sociedade com Pedro Bordino da Câmara (PENNA & BORDINO) e depois com Dr. Júlio Pinto Pacca, de loja de fazenda de secos e molhados na rua principal. Em 1846 foi nomeado adminsitrador do Registro do Onça, no caminho para o porto de Mambuca, onde permeaceu até 1861. Capitão do 6º Batalhão da Guarda Nacional, reformado no posto de Major por decreto de 18/04/1874 e um dos chefes do Partido Conservador na localidade, onde exereceu os cargos de delegado (1875-1876); membro do Conselho Deliberativo da Junta Conservadora do partido; responsável pela junta de alistamento para os "Voluntários da Pátria", em 1865, por ocasião da Guerra do Paraguai. Em 1849 recebeu do governo imperial a "Ordem da Rosa", no grau de cavaleiro (Comendador). Como fazendeiro foi proprietário da grande Fazenda Sebastopol, na mesma localidade, sendo um dos primeiros a adquirir dos Estados Unidos uma máquina de beneficiar café.
(3) Nascido em Areias, esteve em São Paulo, onde passou pela Faculdade de Direito de São Paulo pelos anos de 1881 e 1882. Foi professor, na mesma cidade, em 1884, segundo o Almanach da Província de São Paulo, na Escola de ensino primário "Corrêa de Melo".
(4) Trata-se de João Alfredo Correia de Oliveira, político conservador, Presidente do Conselho de Ministros por ocasião da missiva e da abolição da escravatura no Brasil.

Referências

MUSEU HISTÓRICO E PEDAGÓGICO CONSELHEIRO RODRIGUES ALVES. Documentos pessoais do Conselheiro Rodrigues Alves.
LEAL, Carlos Eduardo de Castro. Família Carvalho Leme. Inédito. 

quarta-feira, 14 de novembro de 2018

Olavo Bilac Alvista

Olavo Bilac segura a cabeça de Rodrigues Alves
Montagem a partir de caricaturas de revistas de época
por Joaquim Roberto Fagundes


Os partidários da política pessoal do Conselheiro Rodrigues Alves e família eram chamados pelos oposicionistas da Primeira Republica (órgãos da imprensa, políticos e povo em geral) como ALVISTAS. Principalmente os correligionários que trabalhavam nas eleições, votavam e possuíam emprego público conquistado pelo “cabresto cego e guiado” ou por parentesco próximo. Como exemplo, a cidade de Guaratinguetá, berço natal e político de Rodrigues Alves, onde existiam duas facções políticas distintas e antagônicas brigando para ditar as regras locais: os partidários do Comendador Antônio Rodrigues Alves, irmão do Conselheiro, e os seguidores da família Rangel de Camargo, os CAMARGUISTAS. Era, portanto, uma marca, dentre outras, da política agressiva, desafiadora e sem limites dos primeiros quarenta anos de existência da República Brasileira; ainda em resquícios e travestida nos dias atuais, em especial na última campanha eleitoral presidencial.
Mas durante o período presidencial de Rodrigues Alves houve outro e diferente admirador e amigo do estadista no Rio de Janeiro. Sem, contudo, ser um alvista político e correligionário. Muito mais, talvez, amigo intimo da família do que um defensor ao extremo de sua política “saneadora e modernizadora” da capital brasileira. Um alvista consagrado na literatura brasileira: O “Príncipe dos Poetas”: Olavo Bilac.
Segundo o literato e memorialista Humberto de Campos, na sua obra “Diário Secreto”, Olavo Bilac teria dado mostras da sua grande simpatia e cavalheirismo para com Rodrigues Alves e família durante o levante político-militar na noite de 14 de novembro de 1904, decorrente da aprovação da lei da “Vacina Obrigatória” (1) e de uma forte e sectária oposição militar visando instaurar uma ditadura militar no país após a renúncia do titular, que, ao contrário do desejado pelos rebeldes, não o fez, declarando expressamente que não sairia do local (2), com a célebre frase: “AQUI É O MEU LUGAR” (3).
Naquela noite, o Palácio do Catete ficou todo cercado por militares e oficiais obedientes ao presidente. Conta o autor, por outra testemunha ocular, o apoio de Olavo Bilac:

“Sexta-feira, 27/01/1928.

... e ainda sobre a mesma figura [Olavo Bilac], do meu culto e do seu Bonfim [contou]
‘- Bilac nesse tempo bebia muito. Ele descia para a cidade, ordinariamente, entre as onze horas e o meio dia, trazendo sua crônica diária para a ‘A Notícia’(4). E começava a beber a essa hora, indo assim, a beber quase seguidamente, até alta noite, às vezes até alta madrugada. Ainda tenho na memória uma das ocorrências desse tempo. Foi a 14 de novembro de 1904. Nós havíamos entrado em um restaurante daquela travessa que saí no largo da Lapa, e em cuja esquina fica, ainda hoje, o Grande Hotel. Saímos tarde da noite e íamos para casa, quando, ao passarmos em frente ao Catete, vimos o palácio cercado por grande força, que aguardava ali o ataque da Escola Militar, que obedecia ao comando do Travassos (5) e do Lauro Sodré (6). Inteirado dos acontecimentos, Bilac, que havia bebido mais do que nunca, fez alto e declarou: - Eu não posso ir para casa... Eu vou fazer companhia a meu amigo Rodrigues Alves!
E dando-se a conhecer, penetrou no Catete, onde ficou até o dia seguinte, valendo-lhe isso uma formidável descompostura do ‘Correio da Manhã’ (7).
Rodrigues Alves, conclui Bonfim (8), - tinha por Bilac a maior estima. Dizia até que este namorava uma filha do presidente, que fazia maior gosto no casamento. O que é certo é que, se Bilac tivesse pedido a Rodrigues Alves um lugar na política ou na administração, teria sido imediatamente satisfeito'. 

Por fim, apenas existe o relato do autor sobre os acontecimentos e o companheirismo de Bilac. Sabe-se que Bilac não casou na família do Conselheiro. Quem sabe apenas enamorado de uma delas. Nos registros deixados por Rodrigues Alves a respeito do evento também não existe menção alguma ao fato. Parecem existir fotos de Bilac em eventos sociais onde o titular estava presente.
Mas a história é enriquecida com as memórias póstumas de fatos cotidianos desconhecidos e o relato de Humberto de Campos parece ter procedência e revela algo mais que a história oficial.

Notas

(1) Para os episódios relativos ao caso da Vacinação Obrigatória pode-se ler, entre tantos estudos, a obra: CARVALHO, José Murilo de. Os Bestializados – O Rio de Janeiro e a República que não foi. 2 ed. São Paulo: Companhia das Letras, 1987. Como também os artigos e caricaturas publicados aqui.
 (2) Os auxiliares mais próximos do presidente queriam que ele saísse e fosse para o mar, utilizando os fundos do palácio, que por aquele tempo tinha acesso direto ao mar. Como aconteceu algumas vezes com o Presidente Epitácio Pessoa fez durante o seu governo em Estado de Sítio. Por sua postura em ficar no palácio foi confeccionada uma pasta em couro com um cartão de prata fixada na frente com os dizeres do presidente (foto acima). Ver a respeito do levante em FRANCO, Afonso Arinos de Melo. Rodrigues Alves: apogeu e declínio do presidencialismo. Rio de Janeiro: Livraria José Olympio Editora, 1973.  
(3) Fato similar aconteceu, em outras condições e perspectivas, por Getúlio Vargas exatamente 50 anos depois, antes de cometer suicídio.
(4) Jornal carioca onde Bilac colaborou com seus poemas e crônicas.
(5) General Silvestre Travassos, dirigente da Escola Militar da Praia Vermelha-RJ.
(6) Tenente Coronel do exército e político paraense. Primeiro governador do Estado do Pará e senador. Foi um dos maiores opositores do governo de Rodrigues Alves.
(7) Jornal carioca que fazia franca objeção ao governo RA.
(8) Intelectual, escritor e médico, nascido em Sergipe.

Referências

CAMPOS, Humberto de. Diário Secreto. Rio de Janeiro: Edições O Cruzeiro, 1954.
CARVALHO, José Murilo de. Os Bestializados – O Rio de Janeiro e a República que não foi. 2 ed. São Paulo: Companhia das Letras, 1987.
FAGUNDES, Joaquim Roberto Fagundes & MAIA, Thereza Regina de Camargo. Guaratinguetá: Ontem e Hoje. São Paulo: Editora Noovha America, 2010.
FRANCO, Afonso Arinos de Melo. Rodrigues Alves: apogeu e declínio do presidencialismo. Rio de Janeiro: Livraria José Olympio Editora, 1973.
JORGE, Fernando. Vida e Poesia de Olavo Bilac. 5 ed. revista e atualizada. Osasco, SP: Novo Século, 2007.

domingo, 11 de novembro de 2018

A Presidência que Não Foi

Imagem: Revista "O Malho" - 1918


Em 15 de novembro de 1918 um novo governo deveria tomar posse na República do Catete. Assim procedeu sem o principal titular eleito pelo "voto popular". Deveria assumir, pela segunda vez, o Conselheiro Francisco de Paula Rodrigues Alves. Considerado na época um estadista e um excelente administrador. O único nome conciliar num período político conturbado e de grandes transformações no mundo e no país. Um Brasil sem líderes com visão renovada, ainda impregnado pelo modelo político instaurado em 1889 e que agonizava. Era o principio do fim da chamada "República Velha", com a morte do septuagenário homem dos dois regimes políticos, segundo a visão do seu biógrafo Afonso Arinos de Mello Franco. 
Naquele momento, como acontecera em 1985 com Tancredo Neves, assumiu o vice-presidente Delfim Moreira, mineiro das velhas lides oligárquicas, juntamente com os ministros escolhidos por Rodrigues Alves, cujas compatibilidades, para alguns, não eram das melhores. E, deste modo, permanceu até a morte do titular, instalando-se, durante algum tempo, a discussão constitucional sobre a realização de novas eleições. Apresentada, grosso modo, ainda na velha fórmula política do PRP (Partido Republicano Paulista) e PRC (Partido Republicano Conservador) fundeada na hegemonia dos dois grandes estados geradores de candidatos: São Paulo (governador Altino Arantes) e Minas (Arthur Bernades). E com o Rio de Janeiro disputando um lugar ao sol com a possível chapa Rui Barbosa-Borges de Medeiros. 
Delfim Moreira permanceu até junho de 1919, assumindo por fim Epitácio Pessoa, paraibano eleito em novo pleito, conforme rezava a Constituição, cujo o vice somente seria consolidado presidente se a morte do titular ocorresse após dois anos da posse. 
Começava a partir desse período, depois de momentos de Estado de Sítio, novos contornos políticos cujo resultado seria a mudança de rumos e ideias políticas na década de 1930. Apagando do cenário brasileiro velhos costumes imperiais e republicanos de primeira hora.  

terça-feira, 31 de maio de 2016

Remando contra a Maré


Como exemplo de tantos outros, o Conselheiro Rodrigues Alves desde a meninice frequentou a antiga Corte Imperial do Rio de Janeiro, ainda nos tempos do Colégio Pedro II, antes do ingresso no Curso de Direito no Largo São Francisco, em São Paulo. Portanto, conhecedor do ambiente tropical carioca, com seus casarios coloniais e pequenas casas de cortiço espalhadas costa acima dos morros da Ajuda e de Santo Antônio. Como ambiente propício para o aparecimento de inúmeras doenças, principalmente ligadas ao universo higiênico desfavorável no miolo central urbano. Fato testemunhado e repudiado historicamente pela Rainha Carlota Joaquina já no começo do século XIX.
Assim, inúmeras foram as vitimas das terríveis doenças e da pouca atenção que se dava aos novos preceitos científicos da medicina no tratamento das diversas patologias causadoras de uma forte incidência de óbitos. Além dos hábitos e costumes pouco recomendados, como dejetos pessoais que os escravos despejam em determinados locais da cidade, determinantes para manter uma cidade nada limpa. E Rodrigues Alves também foi vítima direta e indireta da situação caótica no Rio de Janeiro em fins do século XIX e começo do XX. 
Ainda como Ministro da Fazenda, no governo republicano de Prudente de Moraes, Rodrigues Alves perdeu uma filha em tenra idade para uma dessas doenças incidentes no Rio de Janeiro. Abrindo sua mente para a difícil tarefa, caso um dia fosse eleito, de sanear a cidade, Como fizera anteriormente, quando no Governo de São Paulo lançou um sério programa de combate a essas doenças. 
Ao ser lançado candidato pela presidência da República, ele foi enfático ao dizer que as principais metas do seu governo seriam o saneamento da Capital Federal e o melhoramento do Porto do Rio de Janeiro. Isso porque, entre tantas outras, a febre amarela e a peste bubônica grassavam por todos os recantos desde o inicio da segunda metade do século XIX.  
Mas quando assumiu o cargo, em 1902, sofreu terrível oposição política do Congresso Nacional e da imprensa carioca quanto as medidas pretendidas e que estariam logo sendo implantadas pelos principais ministros que escolheu para capitanear os trabalhos, entre eles, o médico sanitarista Oswaldo Cruz, responsável pela higienização do Rio de Janeiro. 
Ambos, em 1904, foram por essas medidas e concretizações, notadamente a Vacinação Obrigatória para toda a população, alvo preferido do cartunistas e desenhistas dos mais diversos órgãos jornalísticos. A vacina era vista como agressão ao corpo, uma atitude imoral a macular a alma do individuo. O que resultou na famosa Revolta da Vacina.
O desenho acima detalha um pouco daquele momento enfrentado pelo estadista e pelo renomado médico. 
Com o título de "um calhambeque malsinado", a charge mostra, num rio de sangue (vermelho), Rodrigues Alves ao leme do barco, simbolizando a lei da vacinação obrigatória, e Oswaldo Cruz tentando remar diante das dificuldades e a oposição ao cumprimento do plano e da lei, representadas pela correntes e o cadeado presos a duas árvores, que significam as emendas que haviam sido propostas pelo Congresso Nacional. E como em outras ocasiões, Rodrigues Alves em caricatura de dorminhoco, em trajes de dormir, marcando fama que vinha desde o começo da República. 
O calhambeque malsinado seria a causa perdida dos planos do Conselheiro. O que não aconteceu. 

Fonte e Imagem: FALCÃO, Edgard de Cerqueira. Oswaldo Cruz. Monumenta Histórica. São Paulo: Brasiliensia Documenta, 1971. 

quinta-feira, 12 de março de 2015

Rodrigues Alves Revira na Tumba pelo Museu

Nunca soube, por nenhuma fonte escrita ou oral, que o Conselheiro Rodrigues Alves tenha professado o espiritismo. Pelo contrário, em vida, ao que se sabe, foi extremamente católico e fiel aos ensinamentos cristãos, aplicando-os no cotidiano da política, no executivo, no legislativo, e mesmo afastado dos cargos públicos eletivos. Exercia o seu catolicismo principalmente na família, que cuidou com esmero ao longo de grande parte da vida. Respeitando até a sua viuvez, para o resto de sua existência terrena. As cartas da filha Catita que digam. Atualmente conservadas no Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro.
Mas o que aconteceria, entre tantos fatos possíveis, se o Conselheiro fosse um discípulo de Alan Kardec. Penso que, não estando reencarnado, estaria observando a política brasileira e paulista.
Horrorizado, principalmente, com a displicência sobre sua memória terrena. Sem trégua estaria revirando na tumba, pelo descaso com parte de seu significativo legado. Amargamente enxergando o que o seu Estado e a sua Cidade, por seus políticos inertes e obliquamente inteligentes, estão fazendo com aquela que foi a sua casa e hoje é o imóvel fantasma que um dia foi o dinâmico Museu Conselheiro Rodrigues Alves. Onde ainda está abrigado parte do seu cotidiano de vida. Memória e história em abandono, entregue a toda sorte de elementos naturais destrutivos, sem chance de reconstituir, pelo menos em sua grande parte.
Fechado por mais de cinco anos, o que atualmente ainda resiste é apenas resquício do que foi o conjunto exposto ao público desde a sua abertura. O acervo está sendo destruído pelo cupim, alojado quase que exclusivamente numa sala, onde a umidade também impera e é impiedosa.
O prédio, reformado (e não restaurado), reiniciou o processo de degradação física, comprovando o dolo com o dinheiro público dos políticos responsáveis, que continuam a brincar com a coisa pública. Tratam-no como coisa privada, objeto de barganha política com interesse notoriamente eleitoreiro, sem nenhuma finalidade cultural para a comunidade.
Dizem que o erário municipal não tem condições de mantê-lo, mas recordo que ele sempre funcionou com quase nenhuma verba, fosse estadual ou municipal. Os últimos funcionários chegaram mesmo a trabalhar um ano gratuitamente para o Estado, com o afinco de não deixar morrer o ideal de preservar a memória e a história. Divulgando a cultura local e regional. E funcionou desse modo durante muitos anos. Portanto, é mexerico e inverdade, e mesmo desculpas esfarrapadas, dizer que não tem condições de reabrir a instituição e mantê-la funcionando.
Querem sim, usá-la como instrumento de troca, de favorecimento, com claro intuito demagogo como sempre foi. Querem transformá-lo em secretaria municipal sem nenhum planejamento anterior, para virar um local sem identidade própria. Preferem ganhar mais um espaço público dito cultural, no caso um teatro para a cidade, em troca de geri-lo. Cujas negociações se arrastam por parte do Estado e do município sem nenhum resultado. Uma briga de figurões da vaidade que emperra o processo de municipalização. Que ainda tem que passar pelo crivo da Câmara Municipal. Museu e teatro jogados para a ruína, pelo delírio de pessoas pouco afeitas ao raciocínio do bom senso.
O descaso chegou ao Ministério Público, mas por “forças ocultas” até agora não se manifestou em termos concretos. E muito menos puniu os verdadeiros responsáveis por tamanha barbárie cultural. Parece que não conseguem chegar a um consenso sobre. As partes se manifestam usando os argumentos mais pífios. Para safar da incúria e da odiosa falta de compromisso. Cada hora é um argumento; a cada momento um instrumento jurídico interposto para ganhar tempo, fugir da responsabilidade e nada fazer. E se fizer, serão da maneira mais desastrosa, antiética, e nada profissional. Similar a um trampolim ou poleiro para apadrinhados.
Até quando o Conselheiro Rodrigues Alves, de sua tumba, vai gritar por socorro. E ver que aquilo que tanto prezou em vida está se perdendo. Perde-se o patrimônio do povo e perde-se a lisura, a honestidade e a boa vontade por parte dos homens públicos. Certamente está consciente de que não existe mais governo sério, que não cuida do público, e que apenas priorizada a vida privada.
Podem ter certeza, caros leitores, ainda existe solução para o Museu Conselheiro Rodrigues Alves. E mais ainda, pessoas disposta a dar o suor para colocá-lo novamente ao alcance da comunidade. Ideias existem, mas ninguém consulta os verdadeiros profissionais que sabem e bem fazem um bem maior pela cultura.
Não vamos acreditar em dificuldades financeiras, nem em outras desculpas, muito menos em boas intenções. Disto, o inferno está cheio.
Imagem: BIBLIOTECA NACIONAL. Gazeta de Notícias - 14/08/1904.

segunda-feira, 21 de junho de 2010

Fazenda Pinheiro Velho – Onde Nasceu Rodrigues Alves

Símbolo entre tantas que existiram no município, a fazenda Pinheiro Velho representa num certo sentido a marca de um personagem, por expressar a base inicial da carreira política do Conselheiro Presidente Francisco de Paula Rodrigues Alves. Assim como encerra a vida social e econômica da primeira metade do século XIX quando se tenta acompanhá-la pela escassa documentação existente.
Pelo que se sabe a fazenda Pinheiro Velho, localizada no bairro dos Motas, em Guaratinguetá-SP, tem origem na segunda metade do século XIX, quando possivelmente foi construída pelo Alferes Antônio de Paula e Silva, comerciante, tropeiro e plantador de café originário de Minas Gerais, ali estabelecido com a esposa, de família da vila de Cunha (família Pires Querido, moradora desde o século XVIII naquela localidade).
Na fazenda, segundo o recenseamento das ordenanças, o proprietário cultivava cana-de-áçucar, que exportava para a Corte do Rio de Janeiro e fabricava aguardente negociada na vila e em Paratí. E era entreposto de tropas que vinham da vila de Cunha, com que mantinha intenso comércio graças ao relacionamento familiar.
O casal teve, entre outros, a filha Isabel Perpétua de Marins, casada com o português Domingos Rodrigues Alves, pais do Conselheiro Rodrigues Alves e de seus irmãos, fazendeiros e políticos no município e em outras áreas do Estado de São Paulo.
Domingos Rodrigues Alves, com a ajuda sogro, adquiriu, também, terras próximas da família da sua consorte, passando a ser agricultor e depois comerciante estabelecido no centro da cidade.
Com a morte do Alferes Antônio de Paula e Silva e de sua esposa, como era o costume jurídico da época, a fazenda foi dividida entre os herdeiros, cabendo uma parte a Domingos Rodrigues Alves e ao Coronel José Antônio de Paula e Silva, ficando na família até o inicio do século XX, quando foi adquirida por outros proprietários.
Sua sede, de grande pujança, infelizmente não existe mais.
Joaquim Roberto Fagundes
Foto: Álbum Comemorativo do Centenário de Nascimento do Conselheiro Rodrigues Alves. Acervo do Museu Histórico e Pedagógico Conselheiro Rodrigues Alves, Guaratinguetá-SP

quinta-feira, 17 de junho de 2010

Papéis Manuscritos de Nhô Chico

O Museu H.P. Conselheiro Rodrigues Alves, em Guaratinguetá-SP, guarda e conserva parte dos documentos que foram da lavra de Rodrigues Alves, da época em que as missivas possuíam importância e dinâmica, funcionando para comunicar decisões importantes de governo, relatórios, telegramas de Arcebispo, escrituras de venda de escravos e fascinantemente notícias de famílias, recomendações para uma filha que morava em outra cidade, contas a pagar nas antigas e sofisticadas lojas de roupas e acessórios masculinos, recibos de pagamento e, muitas vezes, pedidos de votos e de empregos, de pessoas, em todo o Vale do Paraíba. Era a vida doméstica mesclada com a vida pública, desde tratamentos como Nhô Chico (Rodrigues Alves) por parte de um irmão ou Nhá Mina (sogra) até Excelentíssimo Senhor Doutor Francisco de Paula Rodrigues Alves, Presidente da República dos Estados Unidos do Brasil. Um rico acervo do cotidiano de pessoas que , infelizmente, no mundo globalizado atual, não faz mais sentido, mas que sem dúvida era fascinante pela espera de uma resposta e por mostrar intimamente o pensamento de um homem público e, ao mesmo tempo, comum. O raciocínio de muitos e o respeito através das tratativas de “companheiro e amigo”, “seu muito honrado amigo”, e tantas outras formas que caíram no desuso e, portanto, foram esquecidas e vulgarizadas. Hoje, apenas são importantes para os historiadores que delas se utilizam para formar biografias ou para escrever sobre um determinado tema de época e mesmo, assim, somente aquelas que sobreviveram ao tempo, na maioria, acervo de pessoas importantes. Porém, é um patrimônio público para servir de aprendizado e para indicar o quanto de usos e costumes importantes perdeu-se no tempo e na memória. Um modelo para conhecer e pensar sobre a humanidade que perdemos com a tecnologia e com o capitalismo selvagem. Uma chance de conhecer a nossa história.
Por tudo isto e pela história do Brasil é que iremos resgatar um pouco de “Rodrigues Alves em Velhos Papéis”.
Joaquim Roberto Fagundes
Imagem: Carta do Padre Miguel Martins, vigário de Guaratinguetá, para o Conselheiro Rodrigues Alves, 12 de maio de 1888. Acervo do Museu Histórico e Pedagógico Conselheiro Rodrigues Alves, Guaratinguetá-SP.